Olá pessoal, novamente lhes peço de desculpas não ter feito nenhum post. Mas novamente lhes digo: hoje farei esse post!
kkk...
Fonte: http://www.ceart.udesc.br
Moda e ballet clássico: um estudo sobre figurinos
Resumo
Para entender como se dá a relação entre moda e ballet clássico, este artigo utiliza-se da
pesquisa bibliográfica e da pesquisa de campo, e traça uma perspectiva da estética do ballet
clássico e dos figurinos utilizados, bem como os principais materiais empregados. Autores
renomados do cenário da dança e da produção artística fazem parte da fundamentação teórica
e embasam o desenvolvimento deste estudo. A pesquisa tem por finalidade apontar os elos
entre ballet e moda, explicar como tais elementos e suas propriedades interagem com a figura
humana em um espetáculo de dança e evidenciar os aspectos relevantes no processo de
criação de um figurino.
1. Introdução
Este artigo, que disserta a estética da dança clássica e estuda elementos da moda sob a
ótica do ballet, une duas manifestações distintas, moda e dança, em um campo que pertence
às duas: o figurino.
O figurino transforma o bailarino em uma figura dramática, ele deixa de lado quem é
para interpretar uma personagem. A atriz Clara Carvalho (citada por MUNIZ, 2004, p.44)
relata que “O figurino é algo meio sagrado. É por isso que em certas cerimônias religiosas
existe uma roupa específica. É por isso que diferencia, tira a pessoa de um contexto a põe em
outro.”.
Subir ao palco sem vestir literalmente uma personagem é como andar nu. Cabe ao
figurino contar uma história, transmitir sentimentos e inserir o público no contexto da obra.
Diferente do estilista, que cria para quem veste o que sente, o figurinista cria para quem sente
o que veste. Um espetáculo de dança sem figurinos não é um espetáculo completo.
Este mundo regrado e moldado na velha estética clássica do ballet, como bem é
conhecido, não é bloqueio para mentes criativas e inovadoras. É como se as mesmas grandes
ideias fossem incorporadas a diferentes formas, texturas, materiais e técnicas, sendo então
expressas em uma linguagem diferente, porém, ainda contando as mesmas histórias.
O estudo dos figurinos de ballet clássico, bem como a identificação dos elementos que
compõe um espetáculo de dança, são itens deste artigo, o qual foi elaborado por meio de
pesquisas bibliográficas e pesquisa de campo, realizada na Escola do Teatro Bolshoi no
Brasil, durante os anos de 2010 e 2011.
2. O surgimento do ballet clássico
O ballet clássico é resultado de um processo, desenvolveu-se a partir de outros tipos
de dança, tendo ligações com música clássica e técnicas iniciadas mais tarde. Nasce de um
tipo de dança chamada Morisca, datada já no século XIV. Tratava-se de um tipo de encenação
que contava histórias de grandes feitos de maneira teatral, para o entretenimento das cortes
italianas.
Deve-se atribuir à Renascença Italiana, e ao seu Iluminismo, a unidade dramática da
encenação, que serviu perfeitamente para os propósitos da época. Foi na Toscana, principal
mentora espiritual do Renascimento, que veio para a França, Catarina de Médicis. Nesse país,sob sua tutela, foi produzido o primeiro espetáculo a que se denominou ballet. (CAMINADA,
1999).
Os séculos XVI e XVII destacaram-se pela evolução intelectual, e o aprofundamento
da cultura significou o refinamento e o enriquecimento da arte, restringindo tal patrimônio
cultural às classes abastadas.
Acredita-se que o ballet tenha surgido entre as cortes italiana e francesa, e esta
confusão se dá justo por não haver uma data e um local específicos para seu surgimento.
Também porque, se tudo o que constitui a estética nasceu na Itália, somente na França, com
todo o seu potencial, encontrou condição de florescimento. Sendo a França, na época, uma
potência financeira, o ballet representava e ilustrava a imagem que o país gostaria de passar.
Nesse sentido, “[...] ele surgiu e foi encenado com a finalidade de não só entreter a corte, mas
para mostrar a essa mesma corte e aos países estrangeiros a força da realeza e o poder
econômico da França.” (CAMINADA, 1999).
O ballet desenvolveu-se a partir de manifestações representativas, e só depois adquiriu
a técnica avançada de dança que chega aos dias atuais. Durante os primeiros anos de sua
existência, os elementos de composição de um ballet interagiam de forma limitada, e não se
sabia ao certo de que maneira, esteticamente, interagiriam melhor. O que se observa
atualmente é que
[...] os espetáculos, as obras e os intérpretes maravilhosos que a técnica de dança acadêmica
desenvolveu, ao longo dos séculos, estão muito longe do artificialismo original e, mais do que
isso, enquanto as demais danças surgiam e desapareciam com a mesma rapidez, o ballet
tornou-se uma arte imortal. (CAMINADA, 1999, p. 87)
Esta forma primitiva do ballet denominava-se ballet de cour (do francês, significa
ballet de corte) e era marcada por três características fundamentais: a coreografia, a
concepção geométrica e a forte ligação adquirida um pouco mais tarde com a música, que
com sua perfeição, logo se destacou mais do que a geometrização das peças. (CAMINADA,
1999).
Tão distinta era essa forma de dança, antecedente ao que se conhece hoje por ballet
clássico, que a música só tomou lugar de destaque e atrelou-se às encenações em meados do
século XVII. Até então, a participação dos músicos era desordenada, não seguia uma lógica.
[...] os músicos atuavam no ballet, mas seu papel era pequeno e a própria música era relegada a
segundo plano; a orquestra ainda não apresentava uma formação definida ou ainda não tinha
um lugar estabelecido; mais tarde, a tendência foi colocar os músicos em tribunas separadas, às
vezes no meio da sala. (CAMINADA, 1999).
Tais deficiências, em relação à música e a técnica, aos poucos foram sendo superadas
e a participação de diversos artistas profissionais esboçou a forma atual do ballet clássico. A
sistematização dos ensinamentos, de trato rígido e exigente com os bailarinos, perpetuou-se
até hoje. Os mesmos termos criados na época para designar os tradicionais movimentos de
cabeça, braços, tronco e pés, são ainda hoje utilizados, o que facilita o aprendizado dos passos
e das coreografias, como uma linguagem universal.
Durante aproximadamente cem anos, o ballet seguiu uma curva ascendente de
desenvolvimento, e o entrelaçamento de música, coreografia, técnica e dramatização
encontrou sua maturidade artística com quase um século de vida, quando, a esta altura, já
tinha motivos para ser chamado de clássico. Até os dias atuais, considerando suas passagens
por diversas correntes artísticas, o romantismo é sempre lembrado quando se pensa no ballet
clássico. Achcar (1998, p. 97) analisa que “Não se pode falar na evolução histórica do balé
sem se ressaltar a importância do romantismo, que foi uma espécie de pedra angular na
mensagem estética que prevaleceu através dos tempos”.
De entretenimento da corte à arte teatral, o ballet atravessa cinco séculos reunindo
técnica de dança, dramatização, criação de moda e música de forma clássica.
3. Aspectos clássicos do ballet
No geral, o ballet clássico segue uma linha estética fixada nas suas formas originais
que molda todos os seus elementos. Cenário, música, figurinos e iluminação são regrados e
dificilmente saem do dito normal, que, neste caso, assume o significado de clássico.
É obrigatório considerar, em tal tipo de espetáculo, formas enraizadas em normas estilísticas
bastante precisas. Essas podem ser parcial ou totalmente transgredidas, nessas concepções
cênicas, ou modificadas em relação ao jogo de luzes, ao menor ou maior realismo na
cenografia, à elaboração das personagens ea muitos outros aspectos. Não podem ser, contudo,
“agredidas” no que tange à essência do traje, ou poderiam ser apenas quando a nova
interpretação deste fosse executada por um artista muito original, que soubesse renovar
devidamente a aparência e a substância. (DORFLES citado por LEITE e GUERRA, 2002.
A estética dos figurinos do ballet clássico é ligada à estética da época em que surgiu o
ballet, como relatado por Achcar (1998), por volta do século XV, em meio ao Renascimento e
às cortes italianas e francesas. Neste contexto social, em um tempo em que o bronzeado do sol
e os tons de pele escura eram rejeitados pela nobreza e pela corte como referência de beleza, e
sendo considerados símbolos de trabalho duro, nasce o ballet clássico. Rousso (citado por
FAUX, 2000) detalha como a beleza neste período assumiu formas metódicas, porém
simples em sua essência, para alcançar a perfeição:
[...] os cânones do rosto exigem que ele se projete sobre o pescoço, que seja fino e oval, com
traços regulares, uma testa alta, um nariz reto e delicado, uma boca pequena; nesse conjunto
três coisas devem ser escuras: os olhos, os cílios e as sobrancelhas [...] três coisas devem ser
brancas: as mãos, os dentes, sempre pequenos, e a pele, tão transparente “que se deve ver o
vinho correr pela garganta” quando ela bebe. Enfim lábios, faces e unhas devem ser vermelhas.
Todos se dedicam a esse assunto, mesmo Maquiavel [...].
Nota-se que a beleza ideal do período renascentista permanece atualmente
no visual dos bailarinos: pele clara e aparência delicada e frágil.
Valsa das Flores. Tons de rosa nos figurinos de Valsa das Flores, ballet Quebra-Nozes. Delicadeza e
leveza, típicas da estética do ballet clássico.
4. Elementos de construção de um figurino
Diversos são os elementos de construção utilizados na produção dos figurinos, e cada
um deles possui singularidades exploradas para atender às necessidades do ballet.
A seda é uma das mais antigas matérias primas têxteis. No palco, a transparência do
tecido, combinada aos movimentos, faz com que a bailarina pareça flutuar, tal é leveza
proporcionada pelo tecido. Seu caimento é delicado, sendo bastante utilizado no ballet
clássico.
A seda é também utilizada para a fabricação do tule, material indispensável para o
ballet. O tule, que aparece nas saias na , tem participação fundamental na construção
de todos os tipos de tutus. Muniz (2004), ao caracterizar o tule, afirma que
“Originalmente feito de gaze ou seda, é um tecido fino de malha hexagonal, utilizado em
adornos de vestidos, chapelaria [...] Acredita-se que tenha surgido nas cidades de Tulle ou
Toul, ambas na França, no século XVIII”.
O tule quando feito de fibras sintéticas é o material mais barato utilizado durante a
construção de um tutu. Sua principal característica é dar volume às saias sem deixar a leveza e
a delicadeza de fora. Por ser um tecido transparente, é possível trabalhar com mais de um tom
de cor, para dar um efeito dégradé à saia. Eis um pequeno detalhe que traduz-se em uma
oportunidade de repensar e criar diferentes sobreposições de cores.
O tecido de algodão é principalmente empregado no reforço das peças. Serve como
base para as estruturas de corpetes e coletes. Suas propriedades, provenientes da qualidade da
fibra, também contribuem para a larga utilização deste material nos figurinos e também na
indústria da moda.
[...] o algodão se mantém como a principal fibra têxtil do mundo. Ainda que as sintéticas
tentem alterar sua posição no mercado, ele continua sendo preferido por conta de suas
qualidades naturais, relacionadas a conforto, maciez e durabilidade. Sua versatilidade permite a
combinação com as mais diversas fibras, inclusive as sintéticas. Por todo o seu passado e por
sua importância no ramo têxtil atual, podemos dizer com segurança que o algodão é a fibra que
veste o mundo. (PEZZOLO, 2009)
Os tecidos em malha, de algodão ou sintéticos, estão empregados em quase todos os
figurinos, desde calças de bailarinos até corpetes e tutus, e em elementos de apoio, como
calcinhas e collants. Nenhum outro material permite que o corpo chegue aos seus limites
espaciais.
A criação de um figurino deve levar em conta não somente questões estéticas, mas
também percepções físicas, como qualquer processo de construção de objetos para o ser
humano. Se este limite entre estética e ergonomia existe nas roupas do dia a dia, há de se
relacionar a ergonomia aos processos criativos do ballet, onde a dança exige do corpo dos
bailarinos o seu limite máximo.
A malha desempenha papel fundamental na construção dos figurinos de ballet. Suas
laçadas assumem aspecto de fios em forma de curva, que se sustentam entre si e são livres
para se mover quando submetidas a alguma tensão, o que determina a conhecida flexibilidade
da malha, capaz de fazê-la abraçar as mais complexas formas do corpo humano. Este tecido ébastante elástico porque as laçadas podem escorregar umas sobre as outras, quando sob
tensão, e retornar à posição inicial ao fim da solicitação. Outra propriedade da malha é a
porosidade, o que lhe confere excelente conforto. (PEZZOLO, 2009)
Na Figura 3, o bailarino veste uma calça confeccionada em malha de algodão, que
confere conforto aos movimentos realizados durante o espetáculo.
Figura 3. Quebra – Nozes. Uso da malha de algodão no figurino masculino, ballet Quebra-Nozes.
O veludo, por sua vez, tem valor histórico dentro da dança. Utilizado há séculos, foi
símbolo de status, sendo de uso exclusivo da nobreza e realeza.
Até o século XIX, o veludo foi total ou parcialmente produzido com seda e usado para
vestidos, casacos e também na decoração. No século XX, passou a ser fabricado com acetato,
raiom e algodão, tornando-se artigo popular [...] O veludo alemão, de seda, tem aspecto bem
liso, possui brilho intenso e é o mais caro dos veludos. A roupa confeccionada com esse tecido
ganha visual nobre. (PEZZOLO, 2009, p. 229)
Como observado na Figura 4, em que os bailarinos vestem figurinos confeccionados
com veludo, este tecido nobre se sobressai em espetáculos de dança e encenações teatrais, e
sob o efeito da iluminação pode ganhar diferentes efeitos.
Os veludos, por exemplo, são tecidos excelentes para o palco. Nas roupas que faz para as
óperas americanas, o diretor Franco Zeffirelli recobre os veludos com filó, criando um efeito
de volume dobrado com a incidência de luz. O tecido que já é trabalhado, ganha ainda um
segundo trabalho por cima, que pode ser um bordado com brilhos ou um drapeado. É este
falseamento absoluto do material que dá a magia da terceira dimensão e da profundidade de um
figurino. (CARNEIRO, 2003)
Por fim, temos as ornamentações como processo final na construção de um figurino.
São utilizados diversos materiais, como cristais, espelhos, pedras, bordados, lantejoulas,
cordões, fitas e outros aviamentos que nas mãos de um figurinista viram adornos. É parte do
processo de criação desenhar as ornamentações que serão aplicadas nos figurinos. Não é um
trabalho simplório: demanda pesquisa de temas e referências visuais (cores, texturas e
formas), para então basear este pequeno processo criativo a ser inserido no todo.
Esta customização enriquece o figurino, agrega valor a ele. Sob a iluminação do palco,
as aplicações refletem e tornam visíveis os detalhes criados pelo figurinista.
Outro modo de trabalhar a superfície do tecido, em vez de estampar ou bordar, é ornamentar, o
que confere uma aparência mais tridimensional e decorativa ao tecido. Lantejoulas,
espelhinhos, miçangas, conchas, pedras e penas podem ser usadas para adicionar cor,
padronagens e textura de superfície a um tecido ou uma peça de roupa. (UDALE, 2009)
Seguindo as orientações das pesquisas de referência, busca-se utilizar técnicas e
materiais que condizem com o tema do ballet. As montagens são baseadas em diversas
culturas, que possuem diferentes representações estéticas.
Udale (2009) explica que em certas culturas, a ornamentação expressa identidade
social ou superstições. Botões, medalhões e galões mostram status social e poder, enquanto
penas de águia são usadas por nativos da América do Norte, e significam coragem. Artigos
brilhantes, como moedas ou espelhos, são comumente costurados em roupas para evitar o mal
olhado. A Figura 5 ilustra a ocasião em que referências visuais típicas de culturas específicas
são utilizadas. Nela, os bailarinos usam figurinos construídos com base em referências
culturais árabes.
As aplicações podem conferir ao tecido, ou à peça pronta, um caimento diferente do
que teriam sem ela, e ainda aproveitar-se dos movimentos dos bailarinos para ampliar o efeito
do figurino no palco, como menciona Udale (2009), lembrando os vestidos das
melindrosas da década de 20 em que “contas e lantejoulas eram aplicadas para criar um efeito
decorativo nos vestidos quando elas dançavam no estilo da época. O peso de um tecido pode
ser alterado pela adição de ornamentações [...].”.
Muitos destes materiais utilizados nas aplicações são pesados, e se usados em demasia
podem deixar o figurino com um peso que certamente atrapalhará a desenvoltura dos
bailarinos no palco.
Elas, sobretudo, devem ser uma síntese clara das referências utilizadas, como explica
Harrison (1998), quando diz que as aplicações devem ser simples, porém com linhas fortes,para evidenciar os desenhos e destacá-los; uma vez que pequenos detalhes se perdem na
distância de um auditório.
5. Figurinos tradicionais de ballet clássico
5.1 Tutus
Basicamente o tutu é composto por três partes: a saia, o cós e o corpete. Essa
composição existe nas mais diversas formas de construção de um tutu. Porém, na estrutura
russa de um tutu, o corpete é costurado diretamente no topo da saia, transformando-o em uma
peça só. Desta maneira, o corpete precisa ser mais alongado e acompanhar a curva da cintura,
apertando e modelando o corpo. A saia acaba por ser mais simples do que a versão clássica,
uma vez que o cós, antes mais elaborado, vai desaparecer embaixo do corpete.
Harrisson (1998) menciona a principal diferença entre um tutu russo e um tutu
tradicional, explicando que diferentemente da forma russa, na forma tradicional, o cós
acompanha o corpo até a cintura, é pregado na saia e feito com o mesmo tecido e materiais
que serão utilizados no corpete. O corpete, por sua vez é curto e passa um pouco da cintura,
na frente apresenta uma ponta que desce quase a altura do topo da saia e não é fixado à saia.
Em comum, as duas formas têm a maneira como a saia é constituída: a base da saia é
uma calcinha feita sob medida para a bailarina. Geralmente se faz uma prova para verificar se
ela encaixa perfeitamente no corpo, só então são pregadas as diversas camadas de tule que
formarão o tutu.
O estilo da época em que surgiu o primeiro tutu permitia que as formas dos vestidos
fossem suaves e leves, dando mais liberdade ao corpo. Esta mudança ocorreu após a
Revolução Francesa, quando os ares da democracia, pensada na Grécia, chegavam às cortes
francesas. Então, tudo o que caracterizava a Grécia antiga passou a ser moda. A arquitetura, o
teatro, a arte, a escultura e as silhuetas gregas, inclusive os penteados. Esta modelagem de
roupa ficou conhecida como corte império e influenciou a criação deste novo figurino de
dança, uma saia em forma de sino, com moldes franzidos em corte A, volumosa e ao mesmo
tempo muito leve.
A primeira aparição do tutu conhecido na atualidade como romântico data de 1832.
Schlaich (1998) explica que “Em 1832, Marie Taglioni apareceu em La Sylphideusando um figurino que lhe deu a ilusão de estar flutuando em uma névoa. Este se tornou um
protótipo do tutu romântico […]”.
O tutu romântico é formado por várias camadas de saias, que são pregadas em uma
calcinha. Confere-se na Figura 6, um exemplo de tutu romântico. As principais diferenças são
que ele não possui o ferro que sustenta as camadas na horizontal, em forma de prato, e que o
comprimento das saias é, geralmente, três quartos (¾). O tutu atribui aos movimentos das
bailarinas à leveza que é a essência do ballet clássico.
Como produto da evolução do tutu romântico, temos o tutu clássico, embora o
primeiro não tenha deixado de existir. Com o desenvolvimento da técnica feminina de dança,
é cada vez mais importante mostrar os movimentos precisos dos pés e pernas. O tutu
romântico deu origem ao tutu clássico:
As camadas encurtaram no comprimento até finalmente toda a perna ficar exposta, e a área
pélvica enquadrada em uma saia meramente simbólica. No começo do século XX, dançarinas
usando um tutu com o comprimento na altura do quadril era uma visão comum, e o ballet, que
havia se tornado algo estagnado, teve seu renascimento com as inovações criativas dos Ballets
Russes. (SCHLAICH, 1998)
Estruturalmente, o tutu clássico não difere tanto, em sua construção, do tutu
romântico. Na confecção do tutu clássico as camadas são cortadas em tamanhos decrescentes,
os pedaços são costurados em pregas e então postas em ordem para que a menor camada fique
próxima à região pélvica.
Na camada do meio é posto um ferro circular, principal acessório para a sustentação
das camadas na horizontal.É possível ver como a montagem das saias confere ao
tutu o aspecto de um prato (termo este bastante utilizado para referir-se a esta parte específica
do figurino). Ele geralmente é feito de um material flexível, mas que não cede facilmente,
mantendo um círculo perfeito. Embora o ferro seja fundamental, somente o acabamento dará a
forma perfeita ao tutu. As camadas devem ser costuradas entre si, unindo-se de maneira que
permitam manter o movimento e, ao mesmo tempo, mantenham-se próximas.
5.2 Túnicas e Coletes
A túnica pode ser sustentada por um collant, e geralmente segue justa ao corpo até a
linha do umbigo. Nesta altura, a saia, que não necessariamente precisa estar separada da parte
de cima da túnica, começa a abrir-se em um corte godê, até o comprimento desejado pelo
figurinista. Há também a possibilidade de explorar a assimetria, nas pontas e nos
comprimentos.
Os coletes são peças específicas dos figurinos masculinos. Como no ballet eles
possuem mangas, é comum achar que são membros de uma camisa que está sendo utilizada
por baixo. Entretanto, as mangas são costuradas diretamente na cava dos coletes, e são
construídos desta maneira com o objetivo para causar impressão de que o bailarino está
usando duas peças distintas.
Além das mangas, que são a oportunidade de referenciar diferentes épocas, uma vez
que podem ser construídas com cortes específicos, as aplicações, descritas adiante, também
contribuem para o enriquecimento e caracterização dos coletes.
5.3 Acessórios
Os acessórios de cabeça são parte fundamental na caracterização dos figurinos.
Dificilmente alguma bailarina clássica dança sem um acessório de cabeça, e, mais uma vez,
eles são criados pensando na representatividade de cada montagem.
Este item de embelezamento precisa estar bem afixado à cabeça, para, em momento
algum, correr o risco de cair durante uma apresentação e deixar a bailarina insegura. Para isso,
como diz Harrison (1998), elásticos da mesma cor do cabelo auxiliam na tarefa de fixar o
adereço na cabeça. Outra maneira de fixá-los é a com a utilização de grampos de cabelo, estes
são extremamente eficientes quando o adereço é um arranjo de flores com galhinhos, uma vezque permitem que o grampo passe entre eles e ainda seja preso ao cabelo e ao coque da
bailarina.
Vários são os figurinos que possuem chapéus como acessórios, ainda estes, até quando
a coreografia não exige muita segurança, possuem adaptações para melhor serem fixados à
cabeça.
Já no que diz respeito aos sapatos, nem só de sapatilhas vivem os figurinos de ballet
clássico. Diversas montagens exigem que outros estilos de calçados sejam incorporados ao
guarda roupa dos bailarinos. Botas, sapatos com salto médio, sapatilhas árabes e orientais; de
acordo com o contexto onde cada obra é inserida, as influências da indumentária cada país
chegam às mãos dos figurinistas como referências culturais. Fica claro, porém, que os
calçados, como qualquer outro elemento de construção de um figurino, precisam respeitar os
movimentos realizados pelos pés.
A introdução das sapatilhas de ponta no ballet, embora não possa se datada com
exatidão, representou uma mudança significativa na técnica aplicada às mulheres, e, como
escreve Barringer (1996), a habilidade de ficar na ponta dos pés proporcionou às bailarinas
um novo plano dentro da dança, expandindo sua técnica e criando a ilusão de uma incrível
leveza e projetando um aumento da sensação de ousadia.
5.4 Cabelo e Maquiagem
Como a maquiagem faz parte da caracterização dos personagens, e, uma vez que nem
sempre existe um maquiador de palco experiente disponível para tal tarefa, é trabalho do
figurinista ou do diretor de arte esboçar como será a maquiagem utilizada durante o
espetáculo. Schlaich (1998) escreve que, para o palco, são utilizados produtos específicos, que
precisam ser resistentes ao calor, ao suor e ao contato corporal.
Schlaich (1998) explica que, seguindo esta linha de trabalho, são consideras, também,
as cores presentes no figurino do bailarino. Dentro do mundo do ballet os elementos sempre
combinam, e devem conversar.
Outro aspecto importante é a quantidade de vezes, e com quais figurinos, o mesmo
bailarino entrará no palco. Considera-se também a iluminação do palco, as cores que serão
projetadas no cenário e se será necessário utilizar maquiagem no corpo todo. A respeito da
maquiagem utilizada no corpo, Schlaich (1998, p. 116), descreve que os materiais utilizadospara a maquiagem corporal “geralmente é feita com pancake (pó seco) ou um líquido feito de
pó, em vez de creme, e, geralmente, aplicado com uma esponja natural de tamanho médio a
grande (não uma esponja de látex)”.
É utilizado, ainda, o talco para a maquiagem corporal, quando o tom de pele precisa
ser extremamente branco. O corpo de baile do 2º Ato de Giselle, ilustrado na Figura 10, é um
ótimo exemplo para esse caso. No 2º Ato deste ballet, as bailarinas utilizam talco ou base
branca na pele com o objetivo de parecerem figuras etéreas.
Assim como nos figurinos, onde os detalhes são pensados para que ganhem destaque
no palco, Schlaich (1998) diz que é preciso destacar as formas naturais do rosto com sombras
acima e abaixo do tom natural da pele. O que parece exagerado no espelho pode ser o balanço
perfeito sob as luzes do palco. A maquiagem, como a dança, dá trabalho, e quanto mais se
pratica, melhores serão os resultados.
A caracterização dos bailarinos ainda precisa de mais uma atenção especial aos
cabelos. Como analisa Schlaich (1998), uma bailarina sempre estará com os cabelos presos
em um coque, exceto quando a dramatização do ballet apresentado exija que os cabelos
estejam soltos em algum momento. Tradicionalmente, o cabelo das bailarinas é puxado
fortemente para trás, afastando-o da face e sendo enrolado por mechas em um notório coque,
e por uma boa razão: o cabelo assim está longe do rosto e não será uma distração para a
dançarina ou para o público.
6. A relação entre figurinos e cenários
As luzes transformam a atmosfera do espetáculo, dando um ar de drama, de tragédia
ou de alegria à cena. Além de influenciar na percepção conferida ao espectador, ela interfere
também nas cores e nas texturas de todos os objetos e pessoas que estão no palco. Carneiro
(2003) diz também que os vários planos de luz podem deturpar ou conferir um bom efeito
sobre uma imagem.
Pode-se, metaforicamente, pensar o figurino como componente de uma “pintura”, conjunto de
pinceladas, ao mesmo tempo sobre, entre e dentro de outros conjuntos de pinceladas, que são o
cenário, a luz, a direção e tudo o mais que compõe o espetáculo. A soma desses conjuntos
injeta cor, forma e textura nos personagens que transitam em uma determinada sena, some essa
que finalmente forma um quadro. Esse agregado a todos os outras, informará os detalhes da
peça de teatro, do filme, da novela de televisão, do balé, procurando na sobreposição de todos
esses fatores a perfeita harmonia do espetáculo. (LEITTE, 2002).
Contemplando o espetáculo que é constituído por partes, é preciso trabalhar cada uma
delas tendo por referência o sentido da obra. Impossível o figurino, o texto ou a coreografia
entrarem em conformidade sem serem baseadas em um mesmo contexto, um não é menos
importante do que o outro, e determinadas montagens podem receber mais ou menos
destaque, de acordo com o foco do projeto, mas nem por isso deixam de existir ou deixam de
ser trabalhados.
No palco, diferente do cinema, como explica Carneiro (2003), citando Fontoura, onde
os figurinos ampliam-se e destacam-se em determinados momentos, os bailarinos e o cenário
disputam o espaço com o figurino igualmente, e são tão importantes quanto. Além disso,
precisam ter o mesmo efeito para todos os espectadores, desde os que estão na primeira fileira
até os que se sentam na última.
7. Considerações finais
Durante o desenvolvimento das primeiras etapas do estudo, em que se deu a
observação e análise dos aspectos que fazem parte da história e evolução do ballet, teve-se a
oportunidade de familiarizar-se com ambiente artístico e entender como características
singulares incorporaram-se ao que hoje tomamos por ballet clássico. São particularidades que
edificam a identidade do ballet clássico, e atributos que devem permanecer vivos e presentes,
mesmo em novas montagens e releituras.
O foco do artigo é traçar uma perspectiva da estética do ballet clássico, bem como
suas regras e tradicionalismos, e também sugerir que há espaço para trazer inovações dentro
do processo de criação. Em cada releitura, novas tendências em tecidos, cores, tecnologias e
materiais poderão inspirar o figurinista a expor de maneira diferente as mesmas grandes
histórias.
Em um segundo momento, buscando responder à questão de como se insere, no ballet
clássico, a inovação, aspecto este fundamental da moda, o artigo apresenta os detalhamentosteóricos necessários para embasar um processo de criação. Uma vez que os aspectos clássicos
do ballet servem como ponto de partida para o desenvolvimento dos figurinos, por meio dos
presentes estudos deste artigo, é possível iniciar estudos a cerca de onde as criações podem
empregar-se, por exemplo.
Concluindo, é de se entender que explorar os itens discorridos ao longo do artigo pode
exigir muito do exercício da criatividade. A criatividade, por sua vez, utiliza-se da pesquisa de
referências históricas e técnicas para embasar o desenvolvimento do que poderá ser
apresentado como inovação. É proposto, ainda, que a partir da abordagem técnica aqui
desenvolvida, exigida pelo ballet clássico, novos estudos sejam iniciados no que terá como
objetivo inovar e recriar figurinos de dança clássica.
Referências bibliográficas
ACHCAR, Dalal. Balé: uma arte. Rio de Janeiro: Ediouro, 1998.
BARRINGER, Janice. SCHLESINGER, Sarah. The Pointe Book: Shoes, Training &
Technique. Canada: Dance Horizons/ Princenton Book Company, 1996.
CAMINADA, Eliana. História da Dança: evolução cultural. Rio de Janeiro: Sprint, 1999.
CARNEIRO, Marília. No Camarim das Oito. Rio de Janeiro. Senac Rio, 2003.
FAUX, Dorothy. et al. Beleza do Século. São Paulo: Cosac & Naify Edições, 2000.
HARRISON, Mary Kent. How to Dress Dancers: Costuming Techniques for Dance. Canada:
Dance Horizons/ Princenton Book Company, 1998.
LEITE, Adriana. GUERRA, Lisette. Figurino: uma experiência na televisão. São Paulo: Paz
e Terra, 2002.
MUNIZ, Rosane. Vestindo os Nus: o figurino em cena. Rio de Janeiro: Editora Senac Rio,
2004.
PEZZOLO, Dinah. Tecidos: histórias, tramas, tipos e usos. 2ª Ed. São Paulo: Editora Senac
São Paulo, 2009.
SCHLAICH, Joan. et al. Dance: The Art of Production. 3ª Ed. Canada: Dance
Horizons/Princenton Book Company, 1998.
Beijos, e até a próxima.
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